quarta-feira, 29 de março de 2017

Morte da Igreja - festa do demônio (III Parte)

Pastoral de "manutenção", padres "coveiros" e "encanadores", "heresia do ativismo" (Continuação)


Catequizar, tarefa urgente
A Igreja precisa de estatísticas e assembleias, sem dúvida. No entanto, isto não é o mais importante. Não deve estar na frente da evangelização efetiva. As estatísticos, reuniões, títulos honoríficos e incensos não refletem a verdade sobre a Igreja. Ela é muito mais do que as estruturas visíveis, muitas vezes debilitadas e ineficientes. A Igreja, em sua parte essencial é invisível. É O Corpo Místico de Cristo e Templo do Espírito Santo (Cl 1,18; 1Cor 6,19).
Muita “fumaça pastoral” está na moda. Nojenta e inútil fumaça, que engana, em vez de comunicar a Deus, como se queixa Deus através do profeta (Am 5,21; Is 1,14-15). É preciso fazer um sólido trabalho de evangelização e catequizar o povo para, assim, levá-lo a Deus.
Falar da evangelização não basta. Pois, quem vai fazer ela acontecer de fato? O Santo Antônio de Pádova disse, numa das suas homilias: “Cessem as palavras, falem as obras”. Quanto a isso, o próprio Jesus ordenou: “...ide e fazei com que todos os povos da terra se tornem discípulos meus” (Mt 28,19).
Não se deve insistir, a todo custo, na quantidade dos membros da Igreja, mas na qualidade, ou seja, dar a maior atenção àqueles que de verdade fazem a sua opção por Deus. A igreja repleta de crentes nas celebrações não reflete, necessariamente, a vivacidade da Comunidade eclesial, pois há vários meios para atrair, mas nem sempre para o Senhor... A não ser que se trate das “curas”, dos dízimos e ofertas...
Pessimismo? Exagero? Equivoco?
Tomara que fosse tudo isso. Como eu desejaria que tudo isso fosse um engano meu. Mas, infelizmente, os fatos falam por si mesmos. As pessoas que fazem o uso da razão, até as indiferentes religiosamente, não têm dúvida que a crise atual da Igreja deve encontrar uma adequada resposta, urgentemente, para ela não sucumbir. A Igreja ainda tem a moral, autoridade, mas a maioria maciça, dos que se dizem crentes, não comunga da mesma fonte, que constitui a moral cristã e força do testemunho da primazia de Deus, em toas as áreas de vida cotidiana. Hoje, a situação está piorando em comparação com o passado e assombrosamente soam as palavras de Jesus: “Mas, quando o Filho do Homem voltar, encontrará fé sobre a terra?” (Lc 18,8).
Parece que não está enxergando a morte da Igreja, gradual e sistemática, quem não quer enxerga-la, ou quem já foi enganado pelo Adversário, e com os óculos “cor-de-rosa” constata, que “tudo está bem, apenas o mundo está mudando, portanto, temos que compreender e nos adaptar...”. É, precisamente, isto que o Inimigo quer, que se creia que “tudo vai bem”. Que não se faça nada para modificar o quadro, que basta fazer maquiagens”. Se vai bem, então “por que esquentar”? Enfim, melhor não tocar o assunto, porque ainda poderia “acordar” algum novo são Francisco de Assis e perturbar a perfeita obra da desmontagem daquilo que “montou” o Homem de Nazaré, e o que ainda continua “incomodando o mundo”.
Uma Igreja que não se compromete, de fato, com a catequese e evangelização, não poucas vezes, “foge” para um campo alternativo, cujo lema seria: a “Igreja presente e atuante na sociedade”. Com isso, vai “batizando” e promovendo os valores sociais à custa do trabalho de evangelização.
Ninguém nega que é preciso promover estes valores e buscar a dignidade da vida. Mas, a primeira necessidade não seria voltar a maior atenção à vida da própria Igreja? Se ela não tiver vigor autêntico, ancorado em Deus vivo, ela não será capaz de promover efetivamente aqueles valores que eu chamei de “substitutos do essencial”. Haverá frustração recíproca...
O que fazer?
Fazer a evangelização acontecer, para valer. Deve ser dito claramente que não basta deixar o pecado (Mt 12,43-45) ou fazer o bem. É preciso ter a fé. Não são as obras que salvam (Ef 2,8-10), mas a fé, o que sempre apontava Jesus Cristo (Mc 5,34; Lc 8,40-56; Mt 9,18-26). É claro que não existe a fé viva sem as obras (Tg 2,15ss), mas elas devem ser fruto da fé, devem “nascer da fé”. Porque, pode-se fazer o bem e não ter fé. Quanta gente neste mundo faz coisas boas e não tem fé em Jesus Cristo?! Também, pode-se rezar e não ter fé. - “Credo! Rezar e não ter fé?! Mas, é claro que reza tem fé!”. Infelizmente muitos rezam sem terem a fé. A oração, novenas, Missas podem ser tratadas como meios para conseguir um benefício, “arrancar” de Deus as graças necessitadas. Tornam-se como que amuletos que protegem do mal e através dos quais se procura obter a benevolência de Deus.
Que preço você estaria disposto a pagar para salvar a Igreja do Senhor? Sair das instalações e assumir a fé, como Abraão, Moisés, José, Francisco de Assis? Oferecer suas orações, seus sacríficos cotidianos pela santificação da Igreja? A sua contribuição material como apoio a obra da evangelização (catequese, retiros em regime fechado, materiais)? Ou, então prefere deixar que “os outros” (melhor preparados, com mais tempo, mais recursos) resolvam isto? Ou, ainda, vai optar por “não mexer” com isso aí, porque “alguém pode não gostar”, pode incomodar alguém... Será, que Jesus agiria assim? Ele que com fúria expulsou os negociantes, para purificar o tempo (de pedras) de Deus? (Mt 21,12-13).
Então está na hora de proclamar a mobilização geral! Se amamos a Jesus Cristo não nos pode ficar indiferente a Sua Causa, o Seu Corpo Místico (Col, 1,18; 1Cor 12,12), a Sua Igreja, Mãe que nos deu a vida através do sacramento do Batismo.
Você lembra aquela historinha da floresta em chamas, que conta como todos os seus moradores correm para si salvar, menos um pequeno passarinho, que tenta apagar o incêndio “carregando” a água em seu biquinho? Quando contestado que não vai conseguir, que isto não tem sentido, ele responde: Não importa. Estou fazendo a minha parte”...  É assim, cada um deve fazer o que pode, o que está no seu alcance, contribuir da maneira que lhe é possível. Importa que haja a responsabilidade e ações concretas. Acreditar que “um pouco” faz a diferença...

Morte da Igreja - festa do demônio (II Parte)

Pastoral de "manutenção", padres "coveiros" e "encanadores", "heresia do ativismo" (Continuação)


Pastoral de “manutenção”.
O que se percebe hoje, e o que causa a dor e a tristeza, que as “iniciativas pastorais” são teóricas ou, voltadas meramente, ao “ajuntamento de pessoas” e visam sustentar as estruturas que ainda sobraram da Igreja viva. Em vez da criatividade e iniciativas concretas de reorganização diante da complexidade de mudanças, que vêm acontecendo no mundo, alimenta-se e sustenta as estruturas ultrapassadas e sem a vida, convencendo-se que “melhor fazer pouco do que nada”. A motivação para desenvolver este trabalho de sustentação dá um fato que “a igreja está cheia”. Ainda cheia...
Mas, se esse “serviço”, que não faz crescer a vida e não comunica a vida, for um engano? Sim, pode-se enganar aqueles que vivem tal fé (rotineira, morna, desmotivada) e, também, o mundo, que precisa da esperança [Jo 12,20-21]. Isto acontece quando se propõe e realiza modelos pastorais opostos ao espírito do Evangelho Vivo. Assim, se deturpa a Verdade e se contribui para a multiplicação das caricaturas. Por que não nos perguntarmos em que, realmente, se apoia a esperança dos nossos crentes? Provavelmente seria assustador, para muitos “agentes de pastoral”, ao descobrirem qual é a porcentagem dos participantes dos cultos que “enchem” a igreja pelo hábito e não pela fé.
Sem dúvida, é mais cômodo não enxergar as “rachaduras” e fundamentos frágeis, malfeitos, porque, assim, se evita remorsos e inquietude. “Tampar as rachaduras”, “escorar as estruturas defeituosas”, eis um “bom trabalho”. Escoramentos por toda parte.... Será que os escoramentos garantem a segurança? Por quanto tempo? A não ser que o importante seja o efeito perceptível. Este tipo de “pastoral” Jesus Cristo chamaria de pintar as fachadas ou pintar “sepulcros caiados (Mt 23,27), que só ficam bonitos por fora... “Pintar as fachadas” é bastante atrativo porque é rápido, barato e “dá o IBOPE”. O problema é que, também, inevitavelmente, fabrica “caricaturas religiosas” e “adeptos do Inferno”.
De qualquer ponto de vista o trabalho “pastoral de manutenção” é insensato. A Igreja é a vida! Ela está caminhando, pelo “deserto do desamor do mundo” e tem de acompanhar a evolução de mundo e as suas mudanças. Não pode ser estática. Assim, como vida é dinâmica e se desenvolve constantemente, assim, também a Igreja deve ser dinâmica, missionária, deve ser ansiosa para se expandir, comunicando a vida, como o rio da profecia de Ezequiel (Ez 47,1-9.12). O que está acontecendo é contra a natureza da Igreja. A “pastoral da manutenção” é contra a sua natureza. Não se pode cultivar um saudosismo do passado, porque o que passou, passou. Não vai voltar mais. E ainda pior, pode trazer efeitos não desejáveis (Num 11,4-6).
Todos conhecem os Evangelhos e as orientações de Jesus, que ensinava e chamava a buscar o Reino de Deus em primeiro lugar” (Mt 6,33). No entanto, insiste-se em aplicar próprias “normas”, diluindo assim, o fermento evangélico em vez de ajudar na conversão e adesão ao Projeto de Deus. Deste modo, são como “crianças na praça”, carentes e caprichosas: "A que, pois, compararei os homens da presente geração, e a que são eles semelhantes? São semelhantes a meninos que, sentados na praça, gritam uns para os outros: Nós vos tocamos flauta, e não dançastes; entoamos lamentações, e não chorastes" (Lc 7,31-32).
Padres “coveiros” e padres encanadores
Me perdoem a expressão a seguir, mas eu chamaria, o maior grupo de sacerdotes de hoje (“obreiros” por excelência), de “padres coveiros”. Tais padres, os “coveiros”, preocupam-se em manter as covas bonitas, ou seja, “pintam os sepulcros”, protegem os relictos pastorais sem vida, orgulham-se com a quantidade destes “relictos” e fazem neles a “cosmética pastoral”.
Este trabalho constitui inquestionável razão do seu ministério. Os “coveiros” não têm interesse de “limpar os sepulcros”, reformar as estruturas ultrapassadas e sem vida, pois isto lhes renderia muito esforço, poucos efeitos visíveis, insatisfação dos “donos dos sepulcros” e “maus-olhares”. Além disso, dizem que “não há ordem do bispo”, não há disposições concretas, melhor “ficar quieto”... É óbvio que é fácil celebrar os sacramentos, dar consolos “baratos” (não se preocupe, vai dar certo) e conselhos ineficientes (reze “mais”, faça a novena de...).
Será que este é um trabalho evangélico ou anti-evangélico? O Cristo vivo mandou ressuscitar os mortos, não “maquiar sepulcros”:  “Curai enfermos, purificai leprosos, ressuscitai mortos, expulsai demônios. Gratuitamente recebestes, gratuitamente deveis dar” (Mt 10,8). Quando se anuncia e conduz ao Cristo ressuscitado, os mortos espiritualmente realmente ressuscitam das trevas dos seus sepulcros, que são vícios e pecados (Mt 27,52-53).
A Igreja, sobretudo hoje, necessita de “padres encanadores”, inquietos e criativos, que incansavelmente vão se dedicar revitalizar a “canalização que comunica a Vida”, para “limpar os canos da Graça de Deus” entupidos pelo comodismo, maus hábitos, tradições folclóricas e, enfim, falta de fé. Este tipo de padres, também, vai “instalar” novas, mais adequadas “redes de água Viva”, para levar os crentes da Igreja ao revigoramento e a retomada da sua consciência e missão (Mc 6,7-11).
Há muito fermento bom entre os sacerdotes, mas eles precisam de determinação e coragem de serem “encanadores” e não populistas, “sacramentalistas”, “midiáticos” ou simplesmente carreiristas. O cristão não deve agradar a ninguém, a não ser somente a Deus (Gal 1,10; Mt 6,24). A vida do próprio Jesus Cristo, “Encanador por excelência” pode inspirar e motivar a quem pretende viver fazendo a vontade de Deus.
“Quem não está comigo, está contra mim; e aquele que comigo não colhe, espalha” (Mt 12,30).
A Igreja e poder sobre o Inferno
Diante da afirmação que a Igreja está morrendo, alguém pode questionar: “Ora, Jesus Cristo não garantiu que a Sua Igreja nunca será vencida”? É verdade. Garantiu. Ele não disse, que “o poder do Inferno não poderá vencê-la” (Mt 16,18). Não garantiu que os Seus amigos, a quem deu todas as chaves do Reino, não podem vendê-la por “30 moedas de prata (Mt 26,15).

O mal que vem de fora não tem poder para vencer a Igreja, mas o mal que nasce dentro dela, este sim, destrói (Mc 7,21; Mt 15,19). Basta lançar um olhar à história da Igreja, para ver que quase todas as rixas, divisões, escândalos (a começar pelas heresias dos primeiros séculos, passando por padre Martinho Lutero e chegando ao arcebispo Marcel Lefebvre) foram causados pelos “amigos de Jesus”, homens da Igreja. 
(Continuará)

Morte da Igreja - festa do demônio (I Parte)

Pastoral de “manutenção”, padres “coveiros” e encanadores, “heresia do ativismo”
A finalidade desta reflexão está longe da pretensão de “ser um oráculo” ou um “dono da verdade”. Tenho a consciência de que estou abordando um assunto polêmico. Não me importo se alguém vai concordar ou discordar. Venho para contestar, questionar, provocar a reflexão e discussão. Tomara, que haja qualquer reação, para o que escrevi, mesmo de irritação ou indignação. Com efeito, a Igreja precisa de refletir sobre a sua identidade e retomar a sua consciência de Igreja Missionária. Cada um dos crentes deve assumir o papel que lhe é próprio. Cada um deve fazer a sua parte.
**************
O Concílio Vat.II lembrou que a Igreja foi fundada não para servir, para ser “sacramento da graça para o mundo. A salvação é Cristo, luz dos povos. A Igreja, é sacramento dessa luz que ilumina todo o homem. Por isso, “como Cristo realizou a obra da redenção na pobreza e na perseguição, assim a Igreja é chamada a seguir pelo mesmo caminho para comunicar aos homens os frutos da salvação (LG, 8).
Afirmação subjetiva?
A Igreja está morrendo. Vamos tentar “salvar” a Igreja que é sacramento da nossa salvação? - - Mas, salvar de que? - Da morte, mesmo. Ela está morrendo e vários sinais (indiferença, falta temor a Deus, de vida de oração, de paixão pela evangelização e catequese, bem como idolatria disfarçada de comportamentos religiosos) confirmam este fato. As crises diversas alastram-se pelo mundo inteiro (dessacralização, descristianização, crise de valores, vazio existencial). E, também a Igreja, a Obra de Deus no mundo dos homens, não “escapou” da crise.
Toda crise pode trazer efeitos benéficos, mas precisa ser enfrentada adequadamente. Não se pode banalizar os problemas ou, “varre-los para debaixo do tapete”. Pelo que se pode notar, hoje, somente o Papa Francisco, corajosamente se desdobra para encontrar as soluções das crises e orientar a Igreja para o caminho da vida. Muitos parecem não entender o que pretende este homem de Deus, ou fazem-lhe resistência. Enquanto isso, os sinais de morte se multiplicam assustadamente.
A Igreja está morrendo
A Igreja está morrendo, acredite se quiser. A morte, acontece com o consentimento e aprovação de quase todos os crentes, a começar pelas autoridades eclesiásticas. Para precisar, quero dizer que não se trata das estatísticas que mostram a evasão dos crentes para outras denominações cristãs ou para a indiferença religiosa. Trata-se da qualidade de vida interior e da força de fé daqueles que se identificam com a Igreja e “fazem parte” dela. Daqueles, que frequentam Cultos e (sic!) deixam-se “sacramentalizar” (porque “acumulam os Sacramentos”, recebem-nos, mas não os vivenciam e não tiram proveito, além duma satisfação momentânea).
Em 99% do “crentes” (o cálculo é meu) não há vida de fé! Parecem perdidos e nem sabem o que fazer, até mesmo dentro do templo, quando vêm para celebrar os Sacramentos (tagarelam, mexem nos celulares, observam e examinam toda pessoa que entra, ou sai, etc). A falta de vigor e motivação, revela a tremenda ignorância religiosa(!). Ao mesmo tempo, nota-se uma estranha resistência ao conhecimento, até mesmo, dos princípios da fé. A grande maioria contenta-se com o mínimo. Tem hábitos religiosos, mas não têm fé. Basta “estar na Missa”, mesmo falhando, e confessar, de vez em quando, para se sentir “um bom cristão”. E para ser um bom cristão, também basta?
Ora, as práticas religiosas oriundas da ignorância, na verdade, devem ser chamadas de paganismo ou superstição, porque são apenas revestidas de aparência cristã. Não pode servir como justificação o fato de forem ensinados, desde a infância, “ir à igreja”, repetir formulas de orações, e praticar outros atos, que geralmente se identifica com a pertença a uma religião. Não serve, porque hoje há muitas fontes nas quais se pode adquirir e aprofundar o conhecimento.
Pois bem, a Igreja evangeliza, catequiza, celebra e... o “paganismo religioso”, em vez de diminuir, aumenta. Tem alguma coisa errada.
Se eu disse que a Igreja está morrendo, foi porque sou sacerdote desta Igreja, já alguns anos, e tenho possibilidade de ver o seu caminho descente, em vez de crescente. Confesso, que não conheço nenhuma estratégia atual (diocesana ou nacional) e concreta que, em línea reta, vise ressurgimento, renascimento, religação da Igreja ao tronco da Videira Verdadeira (Jo 15,1-5). Sim, existem as Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil, publicadas a cada quatro anos (as últimas são para quatriênio 2015-2019). Sem dúvida elas têm valor. É um programa. Mesmo não sendo perfeito, mas é um programa que, talvez, faria a diferença se fosse realizado.... Se houvesse interesse, ao menos conhece-lo.
A “heresia do ativismo”
As comunidades eclesiais são compostas de diversas pastorais e movimentos, aonde deve pulsar a vida cristã e deve ser cultivado desejo de comunicar a fé, tomar concretas iniciativas que levam ao crescimento espiritual e ensinar os outros a levar a via cristã. Não quero generalizar, mas dificilmente pode-se encontrar um Grupo da Igreja, que viva a fé e que pode ser indicado, como um espaço do verdadeiro encontro com Deus, para onde podem se dirigir as pessoas que O procuram.
Em geral, as Pastorais e Movimentos são, até, capazes na organização dos encontros (ECC, Segue-Me, etc.), porque há documentos, que minuciosamente, passo por passo, instruem como fazer isto. Assim, capacitam os “agentes” que sabem fazer, conforme ordenam os documentos, mas entender o sentido e o objetivo, muitas vezes, já é um outro problema. Estes trabalhos de “evangelização e pastoral” atraem, porque “tudo está no prato”, não precisa pensar, mas “ser fiel aos documentos”. Além disso, tais agentes se realizam através das atividades concretas, estruturas, funções, equipes. Porém, depois do evento, a euforia e os sentimentos vão passando e, o vazio var reaparecendo...
Deve-se aproveitar aquele despertar, após um evento de evangelização, para dar a formação sistemática, não necessariamente chamada de catequese, mas efetivamente sólida no ensinamento do seguimento de Jesus Cristo, pois nisto é que consiste a vida cristã. Há quem vai me dizer: “mas isto já temos no...” (cita o nome do movimento). Sim, temos, mas, infelizmente, “no papel”. Você já acompanhou algumas vezes estas formações “pós encontro”? Viu a qualidade? Viu efeitos? Viu a convicção dos que o dirigem? È..., tem muito a fazer.
As Pastorais e Movimentos da Igreja deveriam “produzir” obreiros (pessoas comprometidas com a Obra do Reino de Deus), isto é: catequistas, missionários, agentes de apoio... Enquanto isso, se vê muita “fumaça”... Encontros, congressos, eventos, reuniões, etc. – “Ai meus Deus, quanto trabalho!
As iniciativas, a criatividade, a inquietude pastoral são sinais de vitalidade da Igreja. Enfim, assim vivia Jesus Cristo e, assim, ensinava aos seus seguidores, o que bem expressa evangelista Marcos: “Jesus percorria os povoados da redondeza e ensinava. Chamou os Doze e começou a enviá-los dois a dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros. Recomendou-lhes que não levassem para a viagem nada mais do que um bastão; nem pão, nem sacola, nem dinheiro no cinto. Podiam estar calçados de sandálias, mas não deviam usar duas túnicas. E lhes dizia: “Quando entrardes numa casa, ficai nela até irdes embora. Se em algum lugar não vos receberem nem vos escutarem, ao sairdes de lá, sacudi a poeira dos pés...” (Mc 6,7-11). Estas outras orientações de Jesus são voltadas ao objetivo, de levar as pessoas a tomarem uma decisão, aceitar ou não aceitar o convite à conversão. Quem não o aceitar deve ser respeitado na sua liberdade.
(Continuará)

domingo, 12 de março de 2017

Casamento feliz. Sentimento não é amor.

Matrimônio: celebração da aliança ou dos sentimentos?

Depois de refletirmos sobre a vida sacramental e a vida em pecado, quero te “pro-vocar”, meu Visitante, a uma reflexão sobre o matrimônio e as suas vicissitudes. Alguns têm medo de casar, outros acham que “tem que casar” a todo custo; uns exaltam o matrimônio outros alegam ser um “purgatório”... O meu desejo é ajudar a descobrir a mais bela das vocações e a alertar, os que seguirem este caminho, para os maus entendidos, expectativas fantasiosas e egoísticas, em vista de evitar os dramas de separações.

Um “leigo” discursando aos “competentes”?
Iniciando esta catequese-reflexão compreendo, que no mundo em que se supervaloriza os “especialistas de tudo” e “tira chapéu” às celebridades, alguém pode ter receio quanto a habilitação de um frade religioso para pronunciar-se em questões do matrimônio e da família, que ele nem sequer tem experimentado. Ora, não é necessário ser casado para opinar e orientar nestas questões.
Será, que quem é casado, pelo próprio fato torna-se conhecedor da vasta problemática que envolve matrimônios e famílias? Vai ter um só conjugue (em certas situações mais) e uma família. Vai ter a sua própria, única experiência, sendo que os demais casados terão as próprias experiências diferentes da sua. Visto que cada pessoa é diferente, logo todos os matrimônios e todas as famílias são diferentes. Neste caso, o “nosso casado” não poderá ter pretensões de orientar os demais, simplesmente pelo fato de ser casado. Poderá, sim, falar das suas experiências, das suas vitórias e dos seus fracassos.
Um padre, cura das almas que, além da sua formação intelectual e espiritual, no seu dia-a-dia encontra-se constantemente com os mais diversos problemas deste gênero, o suficiente conhece a matéria que envolve a família e, como poucos, está apto para orientar e ensinar.

A “explosão” das crises
Desde que o mundo existe havia crises em todas as áreas de vida. Porém, na vida moderna, parece que elas estão se multiplicando desordenadamente e não se encontra mais nenhuma entidade que não fosse atingida, por algum tipo de crise. Acima de tudo reina a crise de autoridade, que dificulta a busca de soluções, pois para isto tem de haver a confiança.
A mais delicada crise e, ao mesmo tempo, a mais grave quanto as consequências, é aquela que atinge o matrimônio. Todos percebem as dificuldades que enfrentam os casais, no seu dia-a-dia. Fala-se, até, da crise da instituição do matrimônio, pois, o problema afeta não apenas um significante número de casais, mas a própria concepção do matrimônio. É uma crise aguda com tendência de se expandir, devido aos processos culturais e ideias do humanismo moderno, que acima de tudo, promove a felicidade subjetiva do indivíduo.

Sem dúvida, grandes são turbulências que envolvem a vida dos casais. Mas, será que de fato trata-se da crise de instituição conjugal? Esta instituição não está com algum problema. Não precisa de concerto, pois não é uma “invenção” humana e, sim, pensada e querida pelo Criador, conforme lemos: “Não é bom que o homem esteja só. Vou fazer-lhe uma auxiliar que lhe corresponda. … Depois, da costela tirada do homem, o Senhor Deus formou a mulher e apresentou-a ao homem. E o homem exclamou: Desta vez sim, é osso dos meus ossos e carne de minha carne. … Por isso deixará o homem o pai e a mãe e se unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne” (Gen 2,4-25).
O Catecismo da Igreja Católica, também, nos lembra que: “O casamento está inscrito na própria natureza do homem e da mulher, conforme saíram da mão do Criador. O casamento não é uma instituição simplesmente humana, apesar das inúmeras variações que sofreu no curso dos séculos, nas diferentes culturas, estruturas sociais e atitudes espirituais. Essas diversidades não devem fazer esquecer os traços comuns e permanentes. (...) Existe em todas as culturas, um certo sentido da grandeza da união matrimonial” (1603).

A crise que atinge o Matrimônio e Família é uma crise de identidade do ser humano. A imaturidade e desorientação do homem moderno são uma real ameaça do Matrimonio e da Família. A grande maioria dos que decidem contrair o Sacramento do Matrimônio, não têm consciência do que é matrimônio e que tipo de amor, constitui o seu fundamento. A preparação de noivos para o matrimônio tornou-se um ato formal (uma das condições para “casar na igreja”) e não atinge a mentalidade já formada (distante do espírito cristão do matrimônio), até mesmo, porque o casamento já está marcado e “tudo já está preparado”...

O amor é exigente
É necessário conscientizar a todos, que a vida matrimonial não é um meio para encontrar a segurança e satisfação dos desejos, mas é um compromisso, uma aliança, uma responsabilidade, que se assume com ”temor e tremor” (Flp 2,12-16). A Igreja nos lembra através do Catecismo: “Deus, que criou o homem por amor, também o chamou para o amor, vocação fundamental e inata de todo ser humano. Pois o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus, que é Amor. Tendo-os Deus criado homem e mulher, seu amor mútuo se torna uma imagem do amor absoluto e indefectível de Deus pelo homem. Esse amor é bom, muito bom, aos olhos do Criador” (1604).


Ser chamado “para o amor” significa estar disposto a oferecer-se a si mesmo pelo bem e pela felicidade do outro. Esta é natureza do amor revelado por Jesus Cristo. Amar matrimonialmente é, fazer a oblação da própria vida, amar como Cristo amou a humanidade. O matrimônio cristão é sinal do amor de Cristo (por isso é Sacramento, ou seja: sinal sagrado visível, sensível e eficaz), que deu a vida pela Igreja, e o amor de Cristo pela Igreja é sinal e modelo para o amor matrimonial. Durante a celebração do Matrimônio o presidente reza: “Ó Deus que, para revelar vosso plano de amor, quisestes prenunciar no amor do esposo e da esposa a aliança que contraístes com o vosso povo, assim, no matrimônio dos vossos fiéis, elevado à plenitude do sacramento, resplandece o mistério nupcial do Cristo e da Igreja” (Rito do Matrimônio – Bênção Nupcial).

Com toda razão disse “alguém” que “o amor não é chocolate”. E não é. Ele não é para satisfazer paladares (qualquer tipo). O amor é exigente. Assim ensina Jesus Cristo. E são Paulo, ciente disso, referindo-se ao amor conjugal diz:  “Sede submissos uns aos outros no temor de Cristo. As mulheres o sejam aos maridos, como ao Senhor. Pois o marido é a cabeça da mulher, como Cristo também é a cabeça da Igreja, seu Corpo, do qual ele é o Salvador. Maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo também amou a Igreja e se entregou por ela” (Ef 5,21-23.25).

Provavelmente, muitos dos que aspiram casar “na igreja” não sabem que não têm direito ao Sacramento, pelo simples fato de querer coabitar, ou “legalizar” o seu relacionamento, pois o Sacramento não é um dos direitos comuns da sociedade, mas é privilégio dos amigos de Deus, que querem viver segundo a Sua Lei, em todas as situações de vida. Quando falta esta consciência e esta disposição pode-se tratar do sacrilégio (grave ato de impiedade que profana as coisas sagradas). A celebração torna-se um teatro barato, em vez de ser espaço de nobre celebração das núpcias dos filhos de Deus e da alegria “do Céu e da terra”.

“Não gosto mais de você”.
Um dos argumentos mais frequentes para justificar a separação matrimonial e o divórcio é um esvaziamento afetivo. Um “não gosto mais de você” parece ter poder de legitimar a separação. Basta tal frase, para destruir aliança, sonhos e, não poucas vezes, filhos inocentes, as maiores vítimas destes dramas. Nestas ocasiões costumo dizer: “não é necessário gostar, mas necessário é amar”. Para isto foi feita uma aliança (simbolizada pelo anel no dedo dos conjugues); para viver no amor a exemplo de uma vela, que ao emitir a luz e o calor, consome-se a si mesma.

As expectativas egoísticas das pessoas marcadas pelas carências e traumas (vindas muitas vezes da infância) procuram ver o outro, como potencial fonte para satisfazer as suas carências (geralmente inconscientes) e alimentar a afetividade imatura. Infelizmente, os sentimentos são muito instáveis. Mudam de uma hora para a outra. Portanto, não servem como fundamento adequado para se construir uma vida. Seria uma construção sobre areia... (Mt 7,26-27).
A aliança matrimonial, que constitui uma família, é um pacto entre homem e mulher, um compromisso vital entre duas histórias de vida. Não é um “casamento dos sentimentos”, que com o passar do tempo podem se alterar ou “morrer” e, vai restar: “não gosto mais de você”. Na cerimônia da celebração do matrimônio os conjugues dizem: “Eu (diz o nome) te recebo (diz o nome) por minha esposa (por meu marido) e te prometo...”. Te recebo, como uma pessoa, como totalidade. Te recebo para a minha vida, com tudo que você é. Recebo-te com teus sentimentos, mas também com teus traumas e tuas carências. Enfim, recebo-te com toda tua história e com a tua família.

A amor matrimonial no cotidiano expressa-se no labor do dia-a-dia, na renúncia a si mesmo, suportar as fraquezas e defeitos do outro (também dos filhos), na prontidão generosa para servir sempre, mesmo nas indisposições pessoais. Quem se apoia apenas nos sentimentos não será capaz amar deste jeito. Sem querer, será causa de sofrimento e de conflitos. Por isso, os casais juram um ao outro o amor (não sentimentos) na fidelidade e no respeito, em todas as circunstâncias de vida.

Ajudar a um “coitado”
A celebração do matrimônio deve ser precedida por um adequado tempo de namoro, suficiente para se conhecer mutuamente (não deve ser menos de um ano e mais de cinco anos). É extremamente importante este tempo, até mesmo para os sentimentos se estabilizarem um pouco mais. O afloramento e alimentação dos sentimentos tenderá para convivência sexual que, infelizmente, é a pior opção para um namoro verdadeiro e responsável. Esta questão vamos deixar para outra ocasião, pois agora gostaria de abordar a mal-entendida compaixão, a “dor pelo coitado”, uma das causas de fragilidade matrimonial.

Geralmente, no fundo está a decisão antecipada para casar. “Pula-se” tempo necessário para o namoro, não somente pela falta de controle afetiva ou da sexualidade, mas também, pelo sentimento de infelicidade na casa dos pais ou na vida pessoal, ou pela dor por enamorado, que “não é compreendido” pelos outros, que está viciado de entorpecentes, que não tem iniciativa para nada, que todos se aproveitam dele e é preciso ajudá-lo, etc. A criatura espera, ilude-se que o próprio casamento vai solucionar estes problemas, seja pessoais, seja do enamorado, e que isto a faria realizada por “salvar o coitado”.

Neste caso o matrimônio é uma fuga de casa ou da verdade (sobre si mesmo e sobre o outro), em vez de ser uma decisão de amar, de fazer doação de si mesmo. Depois do tal casamento “os olhos se abrem” e a realidade “crua e nua” desmente sonhos de fantasia e expectativas sem fundamento. Percebe que não ajudou a si mesmo e não ajudou ao “coitado”, que como tinha problemas, continua tendo e, muitas vezes, ainda mais graves. Além da decepção resta o que?...

Como ajudar de verdade?
Formar mentalidades, ajudar buscar o sentido concreto de vida, ensinar a responsabilidade... Para isto Igreja possui vários meios. É lamentável, que sobretudo hoje, a Igreja não consegue usar seus recursos efetivamente. A sociedade se torna cada vez mais descristianizada e desacralizada, o que impregna sobretudo as famílias. Mesmo tendo contato com as crianças e adolescentes (depois da Crisma, só o “curso de noivos”), não é possível formar as mentalidades, devido a pouco tempo que os pais oferecem (natação, inglês, música, caratê, chácara, etc.) e a força dos hábitos familiares que “imunizam” os filhos ao que é difícil.
Nestas circunstâncias a Igreja tenta prevenir e impedir as celebrações de matrimônios, diante das evidentes situações problemáticas, que, potencialmente resultarão em separação. Os sacerdotes que têm por dever (párocos e vigários) qualificar os candidatos para o matrimonio (Processo Matrimonial), devem rigorosamente verificar a sua maturidade e as suas motivações. Não devem permitir a celebração dos matrimônios inválidos, por qualquer motivo que seja. Mesmo que sejam chantageados ou ameaçados. A mais comum chantagem é: “se o senhor não fizer o nosso casamento, nós vamos viver em pecado e a culpa vais ser sua”. Deve-se compreender, que o padre, quando realiza a qualificação para o matrimônio está preocupado exclusivamente com bem do casal e com durabilidade da sua união. Por isso, as vezes pode pedir o adiamento da celebração do matrimônio, ou até aconselhar a desistir desta ideia. Neste caso, não deve ser acusado “que não quer”, mas deve ser compreendido pois “não pode”. Esta é uma grande responsabilidade diante de Deus, da Igreja e da sociedade, devido as graves consequências da união possivelmente inválida.

Na verdade, até mesmo uma preparação boa para o matrimônio não garante seu sucesso e não fará com que os casais se tronarão ideais, isentos de crises. As crises fazem parte da vida e não precisam ser sinais de “incompatibilidade de temperamentos” (pois é na diferença que acontece o complemento e crescimento) como argumento para a separação. Superadas as crises, através de diálogo, oração, orientação das pessoas capacitadas, os casais se motivam para maior esforço de controlar a si mesmos e contribuir para a maturidade dos relacionamentos e crescimento do amor recíproco. Faz bem lembrar que a vida não é uma brincadeira e o amor não é chocolate...



quinta-feira, 9 de março de 2017

Vida sacramental e pecado? Conversão. Misericórdia. (II Parte)

A Misericórdia de Deus e os pecadores  
(Comunhão sacramental, divorciados e recasados, pecado) - Continuação

Privados da Misericórdia?
O homem é chamado a escolher a vida, sempre. Se a vida em pecado, ou sem pecado não faria diferença nenhuma diante de Deus e todos deveriam ser tratados igualmente, por que então, a Sagrada Escritura insiste tanto para viver corretamente. “Deus resiste aos soberbos, e aos humildes dá a sua graça. Portanto, sejam submissos a Deus; resistam ao diabo, e este fugirá de vocês. Aproximem-se de Deus, e ele se aproximará de vocês. Pecadores, purifiquem as mãos! Indecisos, purifiquem o coração! (Tg 4,6-8). Ou: “Podes ir, e não peques mais” (Jo 8,10b-11); “Não peques de novo, para que não te aconteça alguma coisa pior” (Jo 5,6.14).
A Comunhão Sacramental não é um prêmio por uma vida correta, que se possa reclamar “por que eu não posso receber, se vivo melhor do que muitos”? No Sacramento do Batismo, o cristão foi inserido no Corpo Misterioso de Cristo (1Cor 12,12-27), fazendo parte d´Ele. Naturalmente deve permanecer neste Corpo, sintonizando-se com a Sua dinâmica e Seu funcionamento. Enquanto permanecer assim, vai ser nutrido, como todos os demais membros do corpo, tendo pleno acesso aos nutrientes que este Organismo possui. Logo, se resolver separar-se do Corpo desconecta-se da Sua vitalidade, perde os nutrientes que recebia, pois estes não podem ser “fornecidos” a distância. E assim, vai findando...

Visto que, a vida cristã consiste em Comunhão com o Corpo (Jesus Cristo), aquele que a deseja deve renunciar outras “comunhões”, conforme lemos: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome cada dia a sua cruz, e me siga. Pois, quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; mas, quem perde a sua vida por causa de mim, esse a salvará. De fato, que adianta um homem ganhar o mundo inteiro, se perde e destrói a si mesmo” (Lc 9,23-25). Se o homem prefere “ganhar”, alcançar qualquer outra coisa na vida, que não seja a Vida em Jesus, mesmo que ganhasse o mundo inteiro, perde tudo, “destrói a si mesmo”, fica nú (Gen 3,7). Esta decisão que leva a morte chama-se o pecado.

O pecado
O pecado mortal, primeiramente, faz morrer a vida íntima de comunhão com Deus, na sua profundidade incondicional (daí se chama “mortal”). Se não for perdoado, causa a morte do homem todo. Ao voltar toda atenção ao objeto diferente do Amor Infinito, acontece a morte da exclusividade do relacionamento vital, como na evangélica videira com ramos (Jo 15,1-5). O pecado que causa esta morte não é um particular, mas um estado de vida contra a vontade de Deus, que na medida do passar do tempo, faz o homem indiferente para com a vida em Deus. 

Quanto mais tempo permanece nesta situação, tanto mais, o mistério da morte expande-se na sua vida. O homem acomoda-se neste “novo” modo de viver, contrário a sua natureza e ao projeto de Vida e, assim, caminha para a morte definitiva, pois sem Deus não há vida.
O pecado pode transformar-se em vício, um mal específico que escraviza o homem. Para ser tratado, o viciado deve procurar um acompanhamento, adequado a sua dependência. Na escolha deste acompanhamento é preciso ter muito cuidado quando a maturidade, responsabilidade e orientação do potencial candidato, a quem vai confiar a si mesmo.

A regra de ouro diz: “É melhor prevenir do que remediar”. Na expressão evangélica ela é assim: “Se a tua mão direita te leva a pecar..., se o teu pé de leva a pecar..., se o teu olho de leva a pecar...” (Mc 9,43-48) é necessário cortar. Cortar os caminhos que levam a este estado, pois é preferível sofrer agora, do que perder tudo...

Questões pastorais
Compreensíveis são afirmações tipo: “tenho direito de ser feliz, por isso divórcio, pratico aborto”, etc., mas são privadas de fundamentos, porque o outro (o conjugue traído, o filho abortado) também tem este direito... E tem, ainda, outros direitos reconhecidos, até pela ONU, como: direto a vida, saúde, segurança etc. Será que é lícito escolher o pecado destruindo legítimos direitos dos outros, a preço dos seus pretenciosos direitos de ser feliz“, de ter”, de “ser alguém”...?

As pessoas em situação de conflito devem conformar-se com a sua situação, pois ninguém de fora é culpado por isso. Para nada serve viver reclamando supostos “direitos”. É melhor e correto procurar e empregar os meios acessíveis para viver a Fé e a Comunhão do Corpo Místico, fora do Caminho Sacramental.

O Catecismo da Igreja aponta tais caminhos da comunhão extra sacramental: "A respeito dos cristãos que vivem nesta situação e geralmente conservam a fé e desejam educar cristãmente seus filhos, os sacerdotes e toda a comunidade devem dar prova de uma solicitude, a fim de não se considerarem separados da Igreja, pois, como batizados, podem e devem participar da vida da Igreja: Sejam exortados a ouvir a Palavra de Deus, a frequentar o Sacrifício da Missa, a perseverar na oração, a dar sua contribuição às obras de caridade e às iniciativas em favor da justiça, a educar os filhos na fé cristã, a cultivar o espírito e as obras de penitência para assim implorar, dia a dia, a graça de Deus." (CIC 1651).

A Igreja tem a missão de socorrer e amparar as pessoas em estado de conflito (pecado). Não condena, nem rejeita a ninguém. Elas não deixam de ser membros da Igreja. Continuam sendo filhos da Igreja, amados e acolhidos por ela. Ainda que não lhes é permitido o acesso ao Sacramento da Confissão e da Eucaristia. Pois, acolher o pecador não significa conceder o perdão do pecado, ou fingir que ele não existe, já que o perdão depende exclusivamente do pecador, do seu arrependimento e da sua conversão.

O mesmo que o Catecismo diz o Papa Francisco na audiência geral, aos 05/08/2015, quando lembrou que os pastores do povo devem “manifestar abertamente e coerentemente a disponibilidade da comunidade em acolhê-los e a encorajá-los, para que vivam e desenvolvam sempre a sua pertença a Cristo e à Igreja com a oração, a escuta da Palavra de Deus, com a frequência à liturgia, com a educação cristã dos filhos, com a caridade e o serviço aos pobres, com o empenho para a justiça e a paz”.
E na Carta com a qual concede a indulgência por ocasião do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, Papa Francisco pede que se “ajude a compreender o pecado cometido, e indicar um percurso de conversão autêntica para conseguir entender o verdadeiro e generoso perdão do Pai, que tudo renova com a sua presença” (01/09/2015).

O Tempo da Quaresma é um momento oportuno para revisar e eventualmente, corrigir o caminho da vida da gente. Jesus Cristo confiou a Igreja tudo que precisamos para alcançar a felicidade. Que tal, tentar redescobrir a riqueza que nos foi oferecida, para não precisarmos levar a vida de mendigos?



Vida sacramental e pecado? Conversão. Misericórdia. (I Parte)

A Misericórdia de Deus e os pecadores 
(Comunhão sacramental, divorciados e recasados, pecado)

Depois do Concílio Vat. II a Igreja vem acentuando mais corajosamente e mais claramente a Misericórdia de Deus, como expressão principal do Seu Amor. Ouve-se muito sobre a amor universal e incondicional de Deus. O Ano da Misericórdia, com a sua iniciativa do ofício de “missionários da misericórdia”, instituído pelo Papa Francisco, despertou, ainda mais, o interesse pela possível mudança no exercício de misericórdia ministrado pela Igreja. Começou-se a questionar, com mais frequência, a disciplina da Igreja acerca desta questão e postular ou, até, “exigir” que todos possam obter a misericórdia Divina e o perdão, o que significa a comunhão com Deus pois, como dizem, “Jesus Cristo o faria”. Portanto, se “Jesus Cristo o faria”, por que, então, a Igreja impede (exclui da Comunhão da Misericórdia) que todos vivam em paz e com a consciência tranquila? Não seria, exatamente, este um gesto de amor e um ato de misericórdia, que a Igreja proclama constantemente?

Tais questionamentos são levantados de várias maneiras (no íntimo das pessoas, nas conversas ou através da escrita) e em diversos ambientes (família, escola, ambientes de trabalho, Igreja). Inclusive o último Sínodo dos Bispos, em Roma (2015) e a Exortação Pós-Sinodal da Papa Francisco “Amoris Laetitia” revelam a grande preocupação da Igreja com relação a comunhão e pecado. Tudo isto mostra a importância e complexidade da problemática do pecado e da vida sacramental.
Perguntemos, então: é justo ou injusto impedir alguém a viver a Graça dos Sacramentos? É justo que alguém que sofre (seja qual for a causa) não possa receber da misericórdia de Deus o conforto e consolo, através dos Sacramentos? A Igreja, realmente, impede alguém a beneficiar-se da Misericórdia de Deus?

A justiça.
Antes de respondermos, vamos o que é a justiça. O conceito de justiça tem a sua origem na língua latina (“iustitia”) e refere-se a uma das quatro virtudes cardeais. Significa uma constante e firme vontade de dar aos outros o que lhes é devido. A justiça é aquilo que se deve fazer de acordo com o direito, a razão e a equidade. A justiça refere-se, também, ao Poder Judicial e à pena ou ao castigo. Quando a sociedade “pede justiça”, pede que o Estado faça com que um crime seja julgado e castigado com a pena merecida, de acordo com a lei vigente.
No sentido religioso, a justiça é um dos atributos de Deus. “Deus é justo” significa que retribui a cada um conforme o bem e o mal que tem feito (Mt 25,31-46; Rom 2,6; Hb 11,6ss; 1Pd 1,17). No entanto, esta justiça é radicalmente diferente da justiça humana, pois, exercida pelo Amor, quer salvar o homem e não condená-lo.

O Catecismo da Igreja (1988-1992) lembra que no Espírito de Deus que recebemos, como cristãos, “tomamos parte na paixão de Cristo, morrendo para o pecado, e na sua ressurreição, nascendo para uma vida nova...” (2Pd 1,2-4). A primeira obra da graça do Espírito Santo é a conversão, que opera a justificação, segundo a mensagem de Jesus no princípio do Evangelho: «Convertei-vos, que está perto o Reino dos céus» (Mt 4,17). Sob a moção da graça, o homem volta-se para Deus e desvia-se do pecado, acolhendo assim o perdão e a justiça do Alto. ´A justificação comporta, portanto, a remissão dos pecados, a santificação e a renovação do homem interior´ (Concílio de Trento, Sess. 6ª, Decretum de iustificatione, c.7: DS 1528). [No 1989]
A justificação desliga o homem do pecado, que está em contradição com o amor de Deus, e purifica-lhe o coração. A justificação continua a iniciativa da misericórdia de Deus, que oferece o perdão; reconcilia o homem com Deus; liberta-o da escravidão do pecado e cura-o. [No 1990]

Retomando a questão perguntamos: É justo tratar todos igualmente? Parece que a resposta já não é tão óbvia. Será que, quem vive “descansado” deve receber salário igual ao que trabalha com dedicação? Quem estuda e aprende dever receber a mesma nota quem nada aprendeu? Será que Deus tratará todos igualmente e a todos vai levar para o Céu (intima e profunda comunhão da alma com Deus)? Mesmo aqueles que nada quiseram saber d´Ele durante a sua vida, tratando-O como que não existisse?
Talvez seja bom lembrar, aqui, a parábola Jesus (Mt 22,1-14), que narra a triste sorte de alguém que entrou numa Festa, não estando devidamente preparado (trajado), o que com evidência mostra que não pode haver a mesma sorte para os que fazem e os que não fazem, o que deveria ser feito (Cf. Ap 19,8). Uma outra parábola é igualmente significativa (Lc 14,15-24) e diz, que aquele que recusa o convite de fazer parte da alegria do Rei, não terá uma outra chance: “eu vos digo: nenhum daqueles que foram convidados provará do meu banquete” (v.24). A decisão de recusa acarreta consequências e, neste caso, a perda para sempre. Não haverá mais portunidade.

A Misericórdia de Deus
O verbo “misericórdia” significa o amor cordial (do latim: miseratio=compaixão + cordis=coração). A Misericórdia Divina e a Justiça Divina expressam o mesmo “rosto” do Deus-Amor. A Justiça Divina é a Sua Misericórdia e, a Misericórdia é a Justiça de Deus, que justifica e não condena um ser humano, se este, ao reconhecer o erro se arrepende e decide retornar aos braços do Pai, como o evangélico “filho pródigo” (Lc 15,17-24).
Deus sempre amará e justificará os seres humanos. O homem, porém, tem poder de “não querer” viver no âmbito deste Amor, preferindo outros caminhos. A sua preferência pode ser o amor próprio, o consumismo, o hedonismo, o “ser como deus”... (Gen 3,5). Neste caso, o Deus Todo-poderoso vai se tornar o “Deus impotente”. Não poderá realizar o seu Plano de Amor. Não poderá justificar. Não poderá fazer nada diante de tal decisão do livre arbítrio do homem, pois a liberdade é dom de Deus e constitui a dignidade humana.

As pessoas que entram no mundo do pecado e decidem permanecer n´ele, como por ex.  viver uma união ilegítima (“hétero” ou “homo”) fazem uma escolha livre. Fazem uma opção, uma preferência, deixado ao lado (abandonando) o projeto de Deus, de viver uma união “pró-vida”. Tomam esta decisão sabendo das consequências (como o sabiam Eva e Adão – Gn 3,3), aventurando-se para realizar o seu próprio projeto, oposto ao de Deus. Enquanto isso, a Sagrada Escritura diz: “Sem Mim nada podeis fazer” (Jo 15,5). A união ilegítima, não sacramental, na luz da Sagrada Escritura é chamada de adultério (Mc 10,6-12; Lc 16,18; Mt 5,32).
Esta não é apenas uma norma disciplinar da Igreja (para que se possa dizer: “a Igreja não permite... a Igreja deveria compreender, deveria ter misericórdia”), que pode ser por Ela dispensada, como por ex. o celibato clerical. É a eterna Lei da Vida (Gen 2,16-17). Fora de Deus não há vida. Somente o vazio, a morte. Nenhuma bênção “poderosa”, nenhum balde de água benta, nenhuma “oração de cura” ou até mesmo os Sacramentos, são capazes de trazer novamente a vida, a não ser uma sincera e autêntica conversão a Deus.

A conversão.
A condição indispensável de viver a Comunhão de Vida é a conversão. Ou seja, é necessário abandonar o projeto próprio de vida (destrutivo) e assumir o Projeto de Deus. Dos dois caminhos, só um se pode escolher e seguir. Por isso, a Sagrada Escritura constantemente clama: “Convertei-vos...”. Jesus Cristo, ao iniciar a Obra também chamava a conversão e arrependimento, como condição de seguir o Caminho da Vida (Mc 1,14-15). O ícone desta verdade encontramos na mencionada já parábola do “filho pródigo” (Lc 15,11-32) ou o episódio do bandido crucificado juntamente com Jesus Cristo (Lc 23,40-43).

Na vida de Adão e Eva, do Livro de Gênesis, vemos que a Comunhão com Deus pode ser trocada (desprezada como tal) imprudentemente, por algo fútil. Uma escolha arbitrária, teimosa e egoística que, obcecada pelos impulsos da vontade própria, não mede as consequências, pode ser dramática. Deus do Antigo Testamento e do Novo Testamento é o mesmo Deus. Na Sua Misericórdia não deixa a morte reinar depois da desobediência, no entanto, a vida já não será a mesma. Ficou atingida. Tornou-se diferente. Ficou desfigurada pelo pecado.

Deve-se lembrar que, o retorno constante à vida em pecado (incluindo o pecado venial) tem efeito de uma anestesia que, eliminando a dor da consciência, permite a morte expandir-se na vida da gente. A consciência e razão alertam para não entrar no mundo da desobediência, mas o resto do homem (corpo, sentidos, afetividade), anestesiados, “gritam de fome pelo pecado”.
O texto clássico da Sagrada Escritura que mostra que o ser humano é responsável pelas suas escolhas e vai acarretar as consequências delas, está no Livro de Deuteronômio: “Veja: hoje eu estou colocando diante de você a vida e a felicidade, a morte e a desgraça. Se você obedecer aos mandamentos de Javé seu Deus, que hoje lhe ordeno, amando a Javé seu Deus, andando em seus caminhos e observando os seus mandamentos, estatutos e normas, você viverá e se multiplicará. Javé seu Deus o abençoará na terra onde você está entrando para tomar posse dela. Todavia, se o seu coração se desviar e você não obedecer, se você se deixar seduzir e adorar e servir a outros deuses, eu hoje lhe declaro: é certo que vocês perecerão! Vocês não prolongarão seus dias sobre a terra, onde estão entrando, ao atravessar o Jordão, para dela tomar posse. Hoje eu tomo o céu e a terra como testemunhas contra vocês: eu lhe propus a vida ou a morte, a bênção ou a maldição. Escolha, portanto, a vida, para que você e seus descendentes possam viver, amando a Javé seu Deus, obedecendo-lhe e apegando-se a ele, porque ele é a sua vida e o prolongamento de seus dias” (Dt 30,15-20).