A Igreja é uma Comunidade, uma Família unida, composta de
crentes em Deus Amor e, também, um Corpo misterioso ou místico (1Cor 12,12; Cl
1,18; Ef 5,23; Rom 12,4-5).
Num corpo qualquer cada membro tem sua função própria. Cada
um deve desempenhá-la bem, para harmonia e equilíbrio do corpo todo. Igualmente
na Igreja. As pessoas são diferentes. Cada uma tem sua história, seus sonhos, suas
tendências, enfim, sua vocação. É óbvio que, numa realidade tão vasta, com
freqüência manifestam-se fenômenos de “incompatibilidade de caráteres”.
Manifestam-se diversos conflitos.
E o que fazer? Fazer de tudo para manter a unidade, mesmo no
meio de conflitos. A unidade na diversidade. A melhor maneira de buscar a
unidade é voltar-se a harmonia no exercício das funções próprias de cada um.
Assim como num corpo qualquer, cada órgão ou célula contribui para o benefício
geral, quando desempenha corretamente o seu papel. Todos e cada um ficam
beneficiados quando cada um cumpre bem as suas funções. Os problemas e
conflitos aparecem e, se agravam, quando há falhas neste funcionamento, quando
começam a brotar as “sementes da mania de grandeza”
Na Igreja não deveria ser assim (Mc 10,42-45). É óbvio. Não
deveria, mas... acontece e, com frequência nada invejável. Acontece e vai
acontecer sempre, porque a Igreja, mesmo sendo Santa, é ao mesmo tempo
portadora das fraquezas humanas. (A Igreja é Santa, mas não por si mesma, pois
só Deus é Santo. [É Santa porque é Corpo Místico de Cristo (1Cor 12,12; Cl
1,18) e o Espírito Santo habita n’Ela (1Col 3,17; 6,19;
Ef 2, 21)].
Deus, que ama muito a Igreja, lhe confia a tarefa de
transmitir a Boa Nova e dar testemunho dela, sobretudo com a própria vida.
Infelizmente, muitas vezes esta tarefa é descumprida pelos homens da Igreja,
por esta razão a Igreja de Jesus Cristo é, também, Igreja de pecadores.
Comunidade de homens que se extraviam no caminho, que traem o amor, que quebram
a Aliança do Batismo, que permitem o mal se propagar e até o praticam. Por isso,
necessitam de perdão e de misericórdia de Deus, para serem, por sua vez,
misericordiosos com os outros. Precisam de conversão contínua.
Estas considerações me parecem importantes para compreender
corretamente o espírito da obediência na Igreja de Cristo. Não é uma
obediência de escravos ou de soldados dum quartel. Esta é uma obediência livre
e dócil, porque assumida na confiança ao Amor e a Providência Divina. Não é
imposta por Deus, mas é proposta como caminho para liberdade plena, vivida por
Filho do Homem (Jo 6,38).
Segundo o Catecismo da Igreja
Católica (CIC) obedecer (lat. "ob-audire")
na fé significa “submeter-se livremente à palavra ouvida... Desta obediência,
Abraão é o modelo que a Sagrada Escritura nos propõe, e a Virgem Maria, sua
mais perfeita realização” (CIC §144).
Nesta obediência se modela a obediência de todos batizados. “Feito membro da
Igreja, o batizado não pertence mais a si mesmo, mas àquele que morreu e ressuscitou por nós. Logo, é chamado a submeter-se aos outros, a servi-los na
comunhão da Igreja, a ser "obediente e dócil" aos chefes da Igreja e a
considerá-los com respeito e afeição.
Assim como o Batismo é a fonte de responsabilidades e de deveres, o batizado
também goza de direitos dentro da Igreja: de receber os sacramentos, de ser
alimentado com a Palavra de Deus e de ser sustentado pelos outros auxílios
espirituais da Igreja. (CIC §1269).
Se a obediência de todos os batizados é assim, a obediência dos homens da igreja (presbíteros e religiosos(as)) deve ser mais perfeita
ainda. "Solícitos cooperadores da ordem
episcopal, seu auxílio e instrumento, chamados para servir ao povo de Deus, os sacerdotes formam com seu Bispo um único presbitério, empenhados, porém, em diversos ofícios. Em cada
comunidade local de fiéis, tornam presente de certo modo o Bispo, ao qual se
associam com coração confiante e generoso. Assumem, como próprias, as
funções e as solicitudes do Bispo e as exercem em seu empenho cotidiano pelos
fiéis. Os presbíteros só podem exercer seu ministério
na dependência do Bispo e em comunhão com ele.
A promessa de obediência que fazem ao Bispo no momento da ordenação e o ósculo
da paz do Bispo no fim da liturgia da ordenação significam que o bispo os
considera como seus colaboradores, filhos, irmãos e amigos, e em troca eles lhe
devem amor e obediência” (CIC §1567).
Um desobediente homem da Igreja (não se trata de um ato isolado, como
fraqueza momentânea) é um infeliz na vida pessoal e um parasito na Comunidade
Eclesial. Com tal homem ninguém pode contar, pois ele pensa só em si e nos seus
próprios interesses. Como é escandaloso tal testemunho! Exteriormente faz parte
da Comunidade que foi instituída para servir, no entanto, interiormente só
pensa em si e serve a si mesmo. Isto é uma verdadeira escravidão, o “cativeiro
do Egito” (Ex 1,1ss).
Segundo
o Catecismo da Igreja Católica há uma estreita correlação entre a obediência e a
liberdade. Na medida em que uma pessoa se torna
livre, se empenha, cada vez mais, na pratica do bem. Ou seja, não pensa em si mesma, mas no outro a quem faz o
bem. “Não há verdadeira liberdade a não ser a serviço do bem e da justiça. A
escolha da desobediência e do mal é um abuso de liberdade e conduz à
"escravidão do pecado" (CIC §1733).
Assim, se torna evidente a necessidade de obediência
filial na Igreja. A desobediência é
um mal. Atinge primeiramente a quem a pratica, mas as suas conseqüências podem
ir muito longe. Basta lembrar o pecado de Adão (Gn 1,26-27) e
as suas conseqüências posteriores (Gn 4), ou pecado de Davi (2Sm 11) com as
conseqüências tristes.
É preciso dizer claramente que a desobediência é pecado. E,
ainda, raiz de outros pecados. É a causa de desordem (Gn 3). O Catecismo diz: “O
pecado ergue-se contra o amor de Deus por nós e desvia dele os nossos corações.
Como o primeiro pecado, é uma desobediência, uma revolta contra Deus, por
vontade de tornar-se "como deuses", conhecendo e determinando o bem e
o mal (Gn 3,5). O pecado é, portanto, "amor de
si mesmo até o desprezo de Deus". Por
essa exaltação orgulhosa de si, o pecado é diametralmente contrário à
obediência de Jesus, que realiza a salvação (CIC 1850).
“Todos os homens estão implicados no pecado de Adão. São Paulo o afirma:
"Pela desobediência de um só homem, todos se tornaram pecadores" (Rom
5,19). "Como por meio de um só homem o pecado entrou no mundo e, pelo
pecado, a morte, assim a morte passou para todos os homens, porque todos
pecaram..." (Rom 5,12). A universalidade do pecado e da morte o Apóstolo
opõe a universalidade da salvação em Cristo: "Assim como da falta de um só
resultou a condenação de todos os homens, do mesmo modo, da obra de justiça de
um só (a de Cristo), resultou para todos os homens justificação que traz a
vida" (Rom 5,18) (CIC 402).
O espírito de materialismo, comodismo, hedonismo, também
dentro da Igreja, alimenta o amor próprio e leva o homem fora de si. Encerra-o
no mundo exclusivamente material, no qual busca a sua realização e felicidade.
Faz com que homem sente-se centro do mundo. A vontade própria se torna único
critério dos desejos e das atitudes. Tudo tem de estar às suas ordens, até
mesmo Deus deve fazer “o que eu preciso”. O seu lema é: “Eu quero, eu posso, eu
faço”. Obviamente, pode-se viver assim, mas deve-se levar em conta as
consequências. Deus tolera a desobediência, mas o desobediente não encontrará
lugar ao Seu lado (Ap 3,15-17), porque o caminho que segue é uma
ilusão e vai levá-lo ao beco sem saída.
Não faltam escândalos e dramas causados pela desobediência.
Sem exagero, pode-se dizer que todos os males, que o mundo e a Igreja vêm
sofrendo, ao decorrer da sua longa história, têm raízes na desobediência. No
mundo, o espírito de desobediência responde pelas guerras, perseguições,
injustiças, fome, etc. E na Igreja, este espírito leva às cismas, heresias,
divisões, violências, diversos abusos e todo tipo de escândalos. Trata-se da
desobediência espiritual (ao espírito da vocação batismal ou religiosa) e da
institucional (àqueles que foram instituídos chefes da Igreja).
A desobediência pode ser explícita (rebeldia em forma
declarada) como descumprimento de obrigações decorrentes do ofício assumido ou
votos religiosos, criação de estilos de vida sem consentimento do bispo,
resistência a transferência do lugar de residência. Pode ser também implícita,
mas igualmente destrutiva, vivida aparentemente como obediência correta, ou até
exemplar (desobediência às Normas Litúrgicas, pastoral individualista,
ausências injustificadas nos encontros de unidade eclesial, manifestações
ostentativas de descontentamento, pertença aos grupos políticos e outros que
negam a doutrina da Igreja ou organizações maçônicas).
As chagas causadas pelos lefebristas, sedevacantistas e
outros desobedientes, até hoje fazem a Igreja sangrar e permanecer dividida. Desgastam-se
energias e recursos materiais para defender as próprias ideias individualistas,
em vez de se empenhar na evangelização, em comunhão com toda Igreja.
Não faltam desobedientes e rebeldes, também, em Anápolis. Alguns individualmente seguem o “caminho da salvação” (talvez queiram
salvar-se da obediência) outros, juntando correligionários criam grupos de
“vida perfeita de Igreja” e fazem a lavagem cerebral das pessoas de boa
vontade, que sinceramente buscam a Deus, porque de nenhum outro modo poderiam atraí-las,
a não ser enganando. Isto é muito grave. Tanto mais grave que revestido de
santidade. A santidade verdadeira, porém, não existe onde há conflito com a
Igreja.
Poder-se-ia esperar que no século XXI, pelo menos os crentes
da Igreja sejam mais próximos ao Evangelho Encarnado e pregado. Como nunca
antes eles têm a disposição várias conquistas e auxílios, em todas as áreas de
vida, incluindo a teologia e a catequese. Têm acesso a verdade. O mundo ansiosamente
espera que testemunhem o Evangelho, numa bela unidade fundamentada na
obediência (Rom 8,19), a exemplo do próprio Jesus Cristo (Jo 5,30; 5,17-30).
Infelizmente, ainda é longe para este sonho se concretizar. Muitas vezes
acontece o contrário.
O
valor de vida do cristão não consiste no lugar que ocupa na sociedade (civil ou
religiosa), mas na maneira de como desempenha o seu papel, de como ele vive, submetendo-se a obediência de fé (Rom 1,5; 16,19.26) e do
amor (Jo 14,15). Consiste na medida
em que está ligado à “Videira” (Jo 15,1-8), na medida de sua união com a Cabeça
(1Cor 12; Col 1,18;), na quantidade de vigor que anima a sua vida. São estes valores que deve buscar e promover para
não ser um hipócrita e escandalizador dos inocentes (Mt 18,6-7; Lc 17, 1-2).
Oportunamente refletiremos
sobre o valor de obediência cristã, madura e responsável.
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